sexta-feira, 26 de fevereiro de 2016

As três tias (norueguês)



   Era uma vez um homem pobre que vivia bem longe, numa cabana na mata, e ganhava a vida caçando. Ele tinha apenas uma filha, que era muito bonita e que, por ter perdido a mãe ainda criança e agora ser quase adulta, disse desejar sair pelo mundo e ganhar seu próprio pão.
   "Bem, mocinha!", o pai exclamou. "Para falar a verdade, aqui você só aprendeu a depenar aves e assá-las, mas de qualquer modo você deve tentar ganhar a própria vida."
   Então a jovem partiu em busca de um emprego, e depois de ter andado um pouco, chegou a um palácio. Lá ela arranjou um emprego, e a rainha gostou tanto dela que todas as outras jovens ficaram com inveja. Resolveram contar à rainha que a jovem dissera ser capaz de fiar meio quilo de linho em vinte e quatro horas — a rainha, é bom que se saiba, era uma grande dona de casa, e prezava muito um trabalho bem-feito.
   "Se você disse isso, tem que provar", a rainha disse. "Mas você pode ter um pouco mais de tempo, se quiser."
   Então, a pobre moça não ousou dizer que nunca tinha fiado em toda a sua vida, e apenas pediu uma sala onde pudesse trabalhar sozinha. Isso lhe foi concedido, e trouxeram-lhe a roda de fiar e linho. Então ela se sentou, triste e chorosa, sem saber o que fazer. Puxou a roda para um lado e para outro, virou-a de um lado para outro, mas sem muito resultado, porque ela nunca tinha visto uma roda de fiar em toda a sua vida.
   Mas de repente uma mulher entrou e se aproximou dela: "Por que está chorando, minha criança?", ela perguntou.
   "Ah!", a jovem suspirou fundo. "Não adianta lhe dizer, porque você não vai conseguir me ajudar."
   "Quem sabe?", a velha senhora disse. "Talvez eu consiga ajudá-la."
   Bem, pensou a jovem consigo mesma, de todo modo vou contar a ela, e então contou que as outras criadas tinham espalhado que ela era capaz de fiar meio quilo de linho em vinte e quatro horas.
   "E cá estou eu, pobre de mim, encerrada aqui para fiar todo esse monte de linho num dia e numa noite, quando na verdade eu nunca tinha visto uma roda de fiar em toda a minha vida."
   "Bem, não se preocupe, minha filha", a velha senhora disse. "Se você me chamar de Tia no dia mais feliz de sua vida, fio o linho, e você pode ir dormir."
   Quando ela acordou na manhã seguinte, lá estava o linho fiado em cima da mesa, tão liso e tão fino como jamais se vira antes. A rainha ficou muito satisfeita de obter um fio tão bonito, e deu à jovem uma quantidade ainda maior de linho. Mas a inveja das outras criadas aumentou ainda mais, e elas resolveram dizer à rainha que a jovem dissera ser capaz de tecer o fio que tinha fiado em vinte e quatro horas. Então a rainha disse novamente que a jovem tinha que fazer o que dissera ser capaz; mas, se não conseguisse terminar o trabalho em vinte e quatro horas, ela não seria intolerante e lhe daria um pouco mais de tempo. Também dessa vez a jovem não teve coragem de dizer "não", mas pediu para ficar numa sala separada para tentar cumprir a tarefa. Novamente se pôs a chorar e a soluçar, sem saber o que fazer, quando então uma outra senhora veio e lhe perguntou: "O que a aflige, menina?".
   A princípio a jovem não quis dizer, mas terminou por contar toda a história da sua aflição.
   "Ora, ora!", a senhora disse. "Não se preocupe. Se você me chamar de Tia no dia mais feliz de sua vida, vou tecer esse fio, e você pode simplesmente ir dormir."
   Sim, a jovem aceitou de bom grado. Então foi dormir. Ao acordar, lá estava uma peça de linho na mesa, tecida e com uma trama tão limpa e tão cerrada que não havia tecido que se lhe comparasse. Então a jovem pegou o tecido e mais do que depressa foi dá-lo à rainha, que ficou satisfeitíssima e providenciou uma quantidade ainda maior de linho para ela. Quanto às demais criadas, ficaram ainda mais irritadas, e deram tratos à bola para inventar alguma coisa sobre ela.
   Finalmente as criadas disseram à rainha que a jovem dissera ser capaz de transformar a peça de linho em blusas em vinte e quatro horas. Bem, tudo se repetiu. A jovem não teve coragem de dizer que não sabia costurar. Então foi encerrada numa sala, e lá ficou às lágrimas, cheia de aflição. Mas então chegou outra senhora e lhe disse que faria as blusas, se a jovem a chamasse de Tia no dia mais feliz de sua vida. A jovem ficou felicíssima com a proposta, e então, seguindo a recomendação da senhora, deitou-se para dormir.
   Ao acordar na manhã seguinte viu sobre a mesa as blusas feitas com a peça de linho — e um trabalho bonito como aquele, nunca jamais se viu. E, mais do que isso, todas as blusas estavam marcadas e prontas para usar. Assim, quando a rainha viu o trabalho, ficou tão contente com a forma como as blusas tinham sido feitas que se pôs a bater palmas e disse: "Nunca tive e nunca vi uma costura como essa em toda minha vida". E depois disso ela passou a gostar da jovem como se fosse sua própria filha. E então lhe disse: "Agora, se você quiser, poderá tomar o príncipe como esposo, porque você nunca vai precisar contratar uma mulher que trabalhe para você. Você sabe fiar, tecer e costurar".
   Assim, uma vez que a jovem era bonita e que o príncipe ficou muito feliz em recebê-la como esposa, o casamento logo se realizou. Mas bem na hora em que o príncipe ia se sentar com a noiva para a festa de casamento, apareceu uma bruxa velha e feia, com um narigão que com certeza tinha uns três metros de comprimento.
   Então a noiva se levantou, fez uma mesura e disse: "Bom dia, Tia".
   "Essa aí é tia da minha noiva?", o príncipe disse.
   "Sim, é!"
   "Bem, então é melhor ela se sentar conosco e participar da festa", o príncipe disse. Para falar a verdade, tanto ele como os demais acharam que ela era uma pessoa repugnante demais para ter perto de si.
   Mas então chegou uma outra bruxa velha. Ela tinha tal corcunda que teve dificuldade em passar pela porta. A noiva se levantou num abrir e fechar de olhos e a saudou: "Bom dia, Tia!".
   E o príncipe perguntou novamente se ela era tia da sua noiva. Ambas disseram que sim. Então o príncipe falou que, já que assim era, ela devia se sentar e participar da festa.
   Mas mal eles tinham se sentado, apareceu outra bruxa velha com olhos grandes feito pires, e tão vermelhos, lacrimejantes e turvos que causavam repulsa. Porém mais uma vez a jovem se levanta de um salto, com seu "Bom dia, Tia", e a esta o príncipe também convidou a se sentar. Não se pode dizer que ele estava muito feliz com aquilo, pois o príncipe pensou consigo mesmo: "Que Deus me proteja dessas tias da minha noiva!".
   Então, pouco depois de ter se sentado, ele não conseguiu guardar os pensamentos para si mesmo e perguntou: "Mas como é possível que minha noiva, uma jovem tão encantadora, tenha tias tão disformes e tão repugnantes?".
   "Logo vou lhe contar como isso é possível", disse a primeira. "Eu era tão bonita quanto ela quando tinha a sua idade. Mas tenho este nariz tão grande por ter passado muito tempo sentada, debruçada sobre meu trabalho de fiar, de forma que meu nariz foi crescendo, crescendo até ficar deste tamanho que você está vendo."
   "E eu", disse a segunda, "desde que eu era jovem, me inclinava para a frente e para trás diante do tear, por isso fui criando essa corcova que vocês estão vendo."
   "E eu", disse a terceira, "desde que era pequena, não fiz outra coisa senão cozer, cozer e cozer de olhos fitos na costura, e é por isso que eles ficaram tão feios e vermelhos, e agora não têm mais jeito."
   "Ora, ora!", o príncipe disse. "Foi uma sorte saber disso. Porque, se as pessoas ficam tão feias e repugnantes com esses trabalhos, então minha noiva não vai nem fiar, nem tecer nem costurar até o fim da sua vida."

Do livro "103 contos de fadas", de Angela Carter

***

   "As três tias"
   "O velho Habetrot" é a variante inglesa do conto escandinavo na qual a pessoa que presta ajuda se apresenta ao marido da fiandeira improdutiva como um exemplo do que acontecerá se esta for obrigada a trabalhar como fiandeira e tecelã (cf. "Vassilissa, a Formosa", p. 329, que de fato fia, tece e costura as blusas do rei à perfeição, portanto não está sob pressão para continuar). A fiandeira ociosa, porém, resiste à pressão das circunstâncias adversas para prendê-la ao pé de uma roda de fiar. Como a única maneira de se livrar da penúria é casar com um homem abastado, ela precisará recorrer a truques e subterfúgios. O que é mais divertido é essa conspiração de mulheres, que não apenas escondem os truques da heroína, mas também a salvam de um futuro de trabalho estafante e exprobação. O mesmo não acontece com as edições pós-1819 da história dos irmãos Grimm, que interpelam o leitor: "Você há de convir que ela era uma mulher repulsiva".
   (Darsent, p. 194.)

Nenhum comentário:

Postar um comentário